terça-feira, 3 de março de 2009

'' AS TIAS DAS TABERNAS ''





Teresa do Rito
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Tinha uma casa de pasto e uma taberna agregada. Mais tarde juntou-se-lhe uma mercearia. Tornou-se muito conhecida nas aldeias dos arredores de Leiria porque os seus estabelecimentos confinavam com o chamado “Pátio dos Burros”, local onde arrumavam os jumentos que na ocasião serviam de transporte para as pessoas se poderem deslocar à cidade. Nos dias de mercado (duas vezes por semana) eram tantos os clientes que obrigavam a Ti Teresa a contratar mais pessoal para a ajudar em tão grande azáfama. Do dinheiro que conseguiu amealhar, e graças à orientação dos seus três filhos, fizeram um prédio, que ainda hoje existe no Arrabalde d’Além. Quando a Ti Teresa foi informada que teria de mudar de casa porque esta iria ser destruída para dar lugar a prédios novos, entre os quais o dos CTT e todos os edifícios adjacentes, sofreu o maior desgosto da sua vida. Mudou para outro local mas, devido ao desgosto, já pouco tempo de vida teve.
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Clementina
Uma senhora também muito conceituada. Chegou a ter duas tabernas e mercearias, uma das quais frente à central eléctrica e outra um pouco mais abaixo, na mesma Rua de Tomar. Também, dada a sua simpatia, cativava com facilidade clientela para o seu comércio. Tinha apenas um filho, do qual ainda existem descendentes.
Olívia
Quem quisesse ver a sua sina, para saber se tinha sorte no casamento ou arranjar um namoro, etc, recorria a esta senhora. Procuravam-na na “Calçada do Bravo”, numa casinha pequena frente ao cruzamento para os Pousos, onde toda a gente a conhecia. Senhora muito fina, solteirona, mas já de idade um pouco avançada. Apresentava-se muito bem vestida para deitar as respectivas cartas e, com as suas “tretas”, lá conseguia amealhar algum dinheiro. Vivia desta profissão.
Teresa do Gaspar
Era proprietária de uma taberna frente à ponte dos Caniços, em conjunto com pequena mercearia. O seu nome era Teresa Cova e era viúva do senhor Gaspar. Senhora muito simpática, gorda e bonita. Para todos tinha palavras de carinho e amizade. Não tinha filhos, mas sim sobrinhos, por quem distribuiu os bens que conseguiu amealhar.
Tiaga
Esta senhora procurava ter bom vinho na sua taberna, a fim de angariar mais clientes que um outro concorrente que ela tinham em frente no mesmo ramo. E então era vê-los à tarde, na hora do lanche, os “copofonistas”, alguns dos quais comerciantes que deixavam os seus estabelecimentos ao cuidado dos empregados de mais confiança, para ir beber, com os seus habituais companheiros, uns copitos acompanhados por um lanche que ela tão bem confeccionava. Alguns deles, por vezes, já de lá vinham com, como se ousa dizer, “um grão na asa”. Esta taberna era no princípio da Rua Mouzinho de Albuquerque.
Maria do Mendes
Com um grande estabelecimento composto por adega, taberna, mercearia e tecidos a metro, porque naquele tempo ainda não havia prontos-a-vestir. O seu marido, o senhor Mendes, pouco ou nada fazia. Ela é que comandava as operações. Só tinham sobrinhos, muitos, e a sua fortuna foi distribuída por alguns por ela seleccionados. Os seus estabelecimentos eram muito frequentados pelos moradores daquele bairro, a “Calçada do Bravo”, hoje rua Paulo VI. No dia oito de cada mês era celebrada uma feira de gado bovino, mesmo em frente ao seu estabelecimento. Nestes dias de feira, era muito difícil entrar no seu estabelecimento, porque o movimento era muito cerrado. Mantinha ao seu serviço, para ajudar nas grandes tarefas em dias de feira, duas senhoras solteiras, talvez de 40 a 50 anos, as “tis” Marquinhas e Beatriz. Não resisto a comentar um pequeno episódio entre mim e ela. Tinha eu nove ou 10 anos. Existia numa das suas propriedades uma figueira com figos muito bons e um dia quis saborear tais delícias. Atrevi-me a entrar na sua propriedade, atravessei a vinha e logo subi à árvore tentadora. Quando estava no início da minha refeição, eis que ouço por baixo: “É tudo teu, meu lambão!” Logo saltei de ramo em ramo e, apenas me apanhei em chão firme, ah pernas para que te quero!... Ela não me iria fazer mal algum, eu sei, e até, se humildemente lhe pedisse desculpa, por certo me daria autorização para encher o estômago. Mas era o respeito...
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Maria dos cabritos
Quem se não lembra desta senhora?! Figura típica muito simpática, baixinha, toda vestida de preto com traje tradicional da aldeia. Bem educada e boa faladora. Por onde quer que passasse criava amizade. Era uma ferrenha anti-salazarista. Mantenho na memória (e tenho até fotografias) da passagem de Humberto Delgado por Leiria, em 1958, e da multidão a querer ver o “General Sem Medo” a depor um ramo de flores no monumento aos Mortos da Grande Guerra. A polícia fez um cordão para que ninguém se aproximasse dos que o acompanhavam, mas ela conseguiu furar e logo se juntou a nós para o cumprimentar. A razão do epíteto deve-se ao facto dela vender, no mercado, cabritos já mortos e preparados para cozinhar.
Bebiana
Oh! Que bolos tão deliciosos! Que pastéis folhados, que outros jamais saboreei! Os jovens (?) da minha idade ainda hoje têm saudades destas delícias fabricadas por ela. Quando a minha mãe trazia guloseimas desta especialista, nem queiram saber... Era de chorar sempre por mais. Tinham fama em toda a Leiria, e não só, os bolos da Ti Bebiana, cujo segredo de fabrico levou para a cova. Faleceu já muito velhinha na sua residência, no Largo Camões, local onde fazia tais delícias.
Ana do Inferno
Frente ao Hospital D. Manuel de Aguiar havia uma mercearia e, por baixo desta, na cave, estava a taberna onde se reuniam os amantes da boa pinga. Faziam-se até reuniões clandestinas, porque naquele tempo tais reuniões eram, como se sabe, proibidas. Quando a polícia soube destas reuniões, tentaram interceptar os participantes para os prender. Entraram primeiro na mercearia e de lá foram à taberna, na cave. Mas tinham que sair à rua. Evidentemente, quando lá chegaram não viram ninguém. É que existia um alçapão onde, e por aviso prévio, todos se esconderam. Comentário dos polícias: “Não vimos ninguém, foram todos para o inferno”. Daí o epíteto Ana do Inferno. Senhora muito conceituada, com dois filhos que se destacaram na cultura e bom trato em relações humanas. Ainda hoje os seus descendentes, em termos de civilidade, lhes seguem o exemplo.
Maria da Costa
Também morava na “Calçada do Bravo”. Comerciante de carnes na praça, era muito conhecida nos meios gastronómicos, pois por se saber que era séria, que não vendia “gato por lebre”, era muito procurada pelos consumidores de carnes. Um dos filhos, que felizmente ainda vive, seguiu-lhe a profissão e ainda hoje a mantém.
Amélia
Se alguém deveria ser condecorado a título póstumo, esta senhora estaria incluída. Principiamos pelo início da sua vida em Santa Catarina da Serra, onde nasceu e casou com Jacinto Prudêncio, trabalhador rural e homem muito honrado. Logo começaram a aparecer os filhos uns atrás dos outros. Era assim naqueles tempos. Em pouco tempo apareceram nove bocas para comer. Para conseguir alimentar esta prole seria necessário um grande esforço. Ti Amélia arranjou um trabalho diário que consistia em transportar as malas do correio para Leiria e vice-versa. Este trajecto era feito diariamente a pé. Juntamente com o correio, transportava ovos e queijos que vendia em Leiria e, no regresso, levava sardinhas que também comercializava em Santa Catarina ou pelo caminho. O dinheiro deste negócio, junto ao ordenadito do correio, daria para tapar as tais ditas boquitas que reclamavam alimento. E assim foi durante alguns anos, até que o seu marido resolver, e muito bem, transferir tudo para Leiria, onde se instalou no Casal de Santo António, perto do cemitério, propriedade aforreira que mais tarde comprou. Viviam da propriedade, de onde produziam vinho, fruta e todos os alimentos necessário para a sua sobrevivência. A Ti Amélia tinha muito jeito para assistir a partos e aqui é que ela se tornou conhecida. Logo se veio a constar esta faceta de parteira, criando amizade com toda a gente. O seu marido não se dava muito bem com ela porque era rara a noite que a não vinham buscar a casa para assistir a um parto e ele ficava bastante aborrecido por isso. Outra das duas facetas constava de, por meio de rezas e na presença de uma peça de roupa, “aliviar” algumas doenças mais vulgares. Enfim, superstições que infelizmente ainda hoje existem. Mas uma coisa curiosa: Ti Amélia nunca levou um tostão de honorários.
Júlia da Batata Roxa
Esta senhora também era muito conhecida. Tinha uma taberna na Rua Comandante João Belo, onde, além do vinho, vendia carvão e petróleo. O queixo dela, muito saliente, tinha a configuração de uma batata: daí a alcunha de Batata Roxa. Um dia a casa ardeu e foi o final do seu comércio.
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